Os números são referências importantes, mas nem sempre traduzem com fidelidade o desempenho do programa social Povo das Águas. Na 5ª edição do programa, realizada entre os dias 24 e 30 de julho na região da parte Alta do Rio Paraguai e Rio São Lourenço, as expectativas foram superadas, com 175 famílias e 637 pessoas atendidas (5 famílias e 6 pessoas a mais do que o estimado).
No entanto, mais do que números, os principais motivos de celebração e regozijo de toda a equipe foram as histórias individuais de cada ribeirinho e a forma como a Ação está salvando e mudando a vida de cada família.
Histórias como a do Sêo Alfredo, 53, da região do Porto Maracangalha, que teve seu sorriso restaurado à partir da extração e prótese total dos dentes; da tímida e retraída Criziane, 6, que sofre de distúrbios psicomotores, mas que esquece suas limitações e se diverte como nunca com as canções e brincadeiras das recreadoras e contadoras de estórias; do sêo Barão, um ermitão de 78 anos que vive com seus 7 cães, Campeão, Perigo, Leão, Guri, Tigre, Dália e Neguinha. “Os cachorros fazem companhia e me protegem dos perigos da mata. Nem onça chega mais aqui”, diz ele, que reconhece o trabalho do Povo das Águas e do Centro de Controle de Zoonoses (CCZ), que protege seus fieis companheiros de doenças letais, como a raiva e a leischmaniose.
Na região da Ilha Verde, no último sábado, 27, o pé da ribeirinha Jucelia Magalhães foi literalmente salvo. No fim do dia anterior ela havia pisado na lâmina de uma foice enquanto caminhava no quintal de sua casa, ali perto, na região do Castelo, e acabou sofrendo um corte pé direito, profundo e grande, de uns 10 centímetros.
Além de perder muito sangue, a jovem corria risco de infecção, tétano, necrose e consequente amputação do membro. Graças ao rápido e eficiente atendimento da equipe médica do Povo das Águas, tudo acabou bem. Após 1h30 de trabalho, envolvendo dois médicos, 1 enfermeira e 1 técnica em enfermagem, além do apoio de 3 colaboradores, foi realizada a assepsia local, sutura e imobilização do pé direito de Jucelia. “O corte impressionou a todos pela extensão e profundidade, além do sério risco de infecção. Longe da cidade, sem o atendimento e procedimento médico adequado, ela poderia até perder o pé”, relatou o médico Juliano Oliveira, responsável pelos 11 pontos da sutura realizada no pé da moça.
“Foi algo divino! Chegamos na hora certa para socorrê-la e isso fez toda a diferença”, acrescenta Elisama Caballero, coordenadora do programa Povo das Águas e que, por mais de 1 hora, segurou firme a mão da moça, dando o apoio emocional para que ela aguentasse firme o procedimento médico.
Um verdadeiro trabalho de equipe salvando vidas. “Nunca vou esquecer o carinho e atenção de todos. Que Deus abençoe o Povo das Águas”, disse Jucelia, emocionada.
A expedição serviu também de oportunidade para rever aqueles que foram atendidos em edições passadas. É o caso da Dona Olinfa Nogales, de 40 anos, que em 2011 teve uma mão quase triturada em acidente no moedor de mandioca, na região da Serra do Amolar. Graças ao trabalho da equipe médica e de enfermagem, a mão de dona Olinfa foi salva, restando apenas algumas marcas. “Além da infecção na mão acidentada, houve perda de tecido e a movimentação estava comprometida. Hoje só ficaram cicatrizes”, comemora Elisângela Lira Bonifácio, enfermeira da equipe do Povo das Águas.
O que dizer então da dona Joana, da Barra de São Lourenço? Aos 89 anos, coordenação motora limitada e dificuldade para andar, a anciã indígena ganhou do Povo das Águas uma cadeira de rodas no ano passado. Mas a principal vitória para ela foi a reconquista da capacidade de sorrir, o que aconteceu à partir da leitura dos livros infantis doados pelo Povo das Águas. “A dona Joana reaprendeu a sonhar, a se divertir e a se transportar a outros lugares por meio da literatura, o que se refletiu em mais qualidade de vida para ela”, explica Miriam Bastos, pedagoga e contadora de estórias que, juntamente com a colega Neide Pereira, acompanha há anos essa evolução e sempre se emociona quando reencontra a dona Joana.
“Graças ao poder do amor e das estórias e fábulas a dona Joana melhorou bastante em diversas áreas, como em seu aspecto cognitivo e até na coordenação motora. Isso é expresso na forma como ela sorri, nos cumprimenta, se comunica e relembra dos fatos do passado”, acrescenta.
Números
Mais do que números, são histórias como as do sêo Alfredo, Criziane, Sêo Barão, Jucelia e dona Joana que permanecem na memória de cada integrante do Povo das Águas e que serão relembradas sempre para destacar a importância desse programa, que em meados do ano passado se tornou Lei Municipal.
No entanto, os números também expressam o bom desempenho do Povo das Águas. Na 5ª expedição, realizada entre os dias 24 e 30 de julho na região da parte Alta do Rio Paraguai e Rio São Lourenço, foram realizados 185 atendimentos médicos; 242 atendimentos de enfermagem; 73 procedimentos odontológicos; 384 vacinas (contra gripe, hepatite, pneumonia, paralisia infantil, meningite, febre amarela e tétano); 123 vacinas anti-rábicas; 33 atendimentos psicológicos; 127 consultas de assistência social; além das 119 crianças que se divertiram como nunca com as estórias, canções, brincadeiras e distribuição de brinquedos. Também foram distribuídas 200 cestas básicas e 350 mantas.