Modalidade de free shop pode diversificar economia na fronteira

Com a publicação da Instrução Normativa 1799/18 da Receita Federal, o mercado brasileiro foi apresentado à modalidade de loja franca ou, como é mais conhecida, free shop. Em 2012, foi sancionada a lei federal 12.723 que autoriza a instalação de “lojas francas para a venda de mercadoria nacional ou estrangeira contra pagamento em moeda nacional ou estrangeira” em cidades gêmeas na linha de fronteira e, em março de 2018, a Receita Federal emitiu os critérios para instalação, reacendendo as discussões.

 

Free shops são semelhantes às lojas disponíveis em área internacional de aeroportos. Contam com isenção de ICMS [confira a tabela abaixo] e impõem um limite de compras de até US$ 300 por consumidor, a cada trinta dias. “O foco é o turista internacional em trânsito, com um aditivo do consumidor local, já que basta ele cruzar a fronteira e voltar para estar retornando de sua viagem internacional”, aponta o consultor jurídico do Sebrae, que apresentou o painel explicativo a respeito da IN, João Ricardo Dias de Pinho.

 

Essa modalidade fica restrita, num primeiro filtro, aos 26 municípios no Brasil que dividem o espaço com cidades do outro lado da fronteira seca. No Mato Grosso do Sul, cinco localidades se enquadram na definição: Bela Vista com Bela Vista Norte (Paraguai), Ponta Porã com Pedro Juan Caballero (Paraguai), Porto Murtinho com Capitán Carmelo Peralta (Paraguai), Mundo Novo com Salto del Guairá  (Paraguai) e Corumbá com Puerto Quijarro (Bolívia). No segundo filtro, para que as cidades de fronteira possam, de fato, instalar um free shop, precisam possuir legislação local autorizando a instalação; e ter unidade da Receita Federal no município.

 

Em Corumbá, a lei municipal 2.498 de 2015 dispõe sobre a instalação de lojas free shop como “mecanismo de desenvolvimento local e regional”. A lei determina a criação de um grupo técnico para elaborar a regulamentação no Município como, horário de funcionamento, zoneamento das localidades propícias para instalação e análise de implantação de projetos de grande porte. Do ponto de vista do Município, falta apenas definir o local de instalação dos free shops. “Ao que tudo indica, é uma oportunidade para empresários do ramo e para o Município é uma maneira de dinamizar a economia local – com a atração do turista de compras e o acesso a produtos mais baratos para a população”, destaca o secretário de Governo de Corumbá, Cássio Augusto da Costa Marques.

 

Os critérios obrigatórios dessa modalidade de empresa dividem opiniões. Em Corumbá, se por um lado existem investidores receosos, por outro há os empresários locais com medo de concorrência desleal. “Embora haja a preocupação natural por parte do comércio local, não encaro como concorrente direto, pois os free shops, pelo menos os existentes atualmente em aeroportos, tem a característica de trabalhar com produtos premium, mesmo que sejam produtos nacionais, são produtos mais diferenciados voltados para o público diferente do comércio central”, aponta a professora da UFMS, Rosa de Barros Ferreira de Almeida.

 

Almeida tratou o free shop em seu mestrado “Free shop na fronteira Brasil-Bolívia: uma proposta para impulsionar o desenvolvimento territorial”, como mais uma oportunidade econômica na fronteira: “fomentaria  o turismo de compras, movimentaria hotelaria e alimentação, basicamente formando um polo junto às lojas em Puerto Quijarro, dada a dinâmica das interações fronteiriças”, destaca.

 

Como a normativa apenas limita a compra por “viajante que ingressar no país e estiver identificado por documento hábil”, os cidadãos da fronteira não são excluídos da possibilidade de compra. “Ao cruzar a fronteira passando pela imigração, já permite a compra”, aponta o consultor do Sebrae e advogado João Ricardo Dias de Pinho.

 

Durante o painel explicativo, foi citada a preocupação de se proteger o comércio local impedindo o acesso do morador de Corumbá nas compras em free shops, opinião que Rosa Almeida veementemente discorda: “Será um fator negativo se for adotado um modelo que exclui o morador local das compras no free shop, sobretudo, para os próprios investidores pois o consumidor vai deixar de consumir in loco para comprar na Bolívia, inclusive com mais facilidades em relação ao limite de cota. Daí todo mundo sai perdendo”, ressalta ao comparar a cota individual de US$ 300 mensais do free shop instalado em fronteira terrestre versus o limite de US$ 150 por visita na Bolívia.

 

Para as empresas optantes pelo free shop, é preciso ter regularidade fiscal perante a Fazenda Nacional; possuir sistema contábil informatizado e sistema de vigilância nas dependências da empresa; ter estabelecimento exclusivo de free shop; possuir patrimônio líquido de R$ 2 milhões ou garantia no mesmo valor; e optar pelo domicílio tributário eletrônico (DTE). A Receita Federal afirmou que já foi consultada por uma empresa fora do Município, com interesse em operar na fronteira. “Essa modalidade vai atrair grandes players que já têm capital e know-how para operar free shop, para empresas sem experiência com comércio internacional, realmente, será muito difícil operar seguindo critérios rígidos com um modelo de negócios robusto”, analisa Costa Marques.

 

Oportunidade de negócios na fronteira

 

O movimento de câmbio influencia o local de compra do turista e o auditor fiscal da Receita Federal em Corumbá, Erivelto Moyses Alencar explica: “um dos outros motivos que pode influenciar o local de compra dos turistas é o câmbio. Se a moeda brasileira estiver valorizada, consequentemente, aumentará o poder de compra e a procura pelos produtos vendidos em lojas francas”.

 

 

Com a alta do dólar, é comum ver carros bolivianos em supermercados e no comércio local, pois os preços se tornam mais atrativos e a qualidade, superior. Diante deste cenário, muitas lojas fecharam as portas no lado boliviano. “O que a gente vê é um movimento econômico muito interessante. Antes, os brasileiros atravessavam a fronteira para comprar mais barato, agora é o consumidor boliviano quem está segurando as vendas no comércio corumbaense”, aponta o secretário de Desenvolvimento Econômico e Sustentável de Corumbá, Luciano Costa.

 

 

Para instalação de lojas free shop, o Município de Corumbá deverá definir as áreas destinadas ao comércio e montar, conforme prevê a lei municipal, um grupo técnico com as entidades empresariais para “elaborar legislações municipais específicas para a regulamentação de free shops – horário de funcionamento, zoneamento e análise de projetos de grande porte”, prevê Costa. “Vamos articular a criação do grupo e, a partir daí, discutir e definir o formato do free shop em Corumbá em conjunto com a sociedade”, finaliza.

 


Por Laryssa Caetano
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