Onde estão as mulheres negras? Quantas senadoras negras você conhece? Quantas ministras? Quantas executivas de grandes empresas? A pergunta é retórica, mas provavelmente sua resposta caiba nos dedos de uma mão, apesar de as negras brasileiras atualmente totalizarem 40,8 milhões, a maioria da população feminina do País.
É verdade que há muitas conquistas a serem celebradas, como o fato de 75% de novos integrantes da classe média brasileira serem negros, de acordo com estudo da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República. Os negros teriam passado a representar 51% da classe média brasileira. Em 2001, esse percentual era de 31%.
No entanto, a despeito da inclusão econômica, há muito a ser feito para combater as desigualdades entre negros e brancos, pois ainda persistem diferenças significativas, por exemplo, nas condições de trabalho vivenciadas por negros e não negros.
Para refletir sobre essas e outras questões, foi realizado na última sexta-feira o 3º Encontro Regional das Mulheres Negras de Corumbá e Ladário. O evento, realizado pela Gerência de Promoção da Igualdade Racial, área ligada à Secretaria de Assistência Social e Cidadania de Corumbá, reuniu quase 200 mulheres no Centro de Promoção Humana e Ambiental Padre Ernesto (Cenper) para discutir sobre “O avanço das políticas para o negro”, “Violência adolescente”, “Negras na religião”, “Saúde da mulher negra” e outros assuntos-tema de palestras de especialistas no assunto.
“Temos de colocar em prática o enfrentamento às discriminações de gênero, étnico-racial e social e propor políticas públicas que possibilitem a promoção de cidadania das mulheres, visando a igualdade e a equidade de direitos, instrumentalizando as mulheres negras para que atuem efetivamente na sociedade como agentes de sua história”, disse Rogério dos Santos, gerente de Políticas para a Igualdade Racial de Corumbá. “Um de nossos principais objetivos é colocar à disposição de vocês informações e conhecimentos que são de suma importância para a emancipação de gênero e de raça, enfim, para todas aquelas que buscam justiça social”, acrescentou ele a uma plateia composta, em as maioria, por mulheres afrodescendentes.
Desigualdades
De fato, basta uma breve análise dos números e estatísticas no País para se constatar que há ainda muito trabalho pela frente.
Segundo estudos de institutos de pesquisa, as mulheres brancas recebem um salário duas vezes maior em relação aos rendimentos mensais das mulheres negras. As negras representam 35% da força ativa de trabalho e ganham, em média 45% menos em relação aos salários dos homens. Nos 300 maiores grupos privados do Brasil, os cargos executivos são ocupados pelas mulheres em apenas 3,5% dos casos (que dirá, então, por mulheres negras!), apesar de 47% das famílias brasileiras serem chefiadas por mulheres. O Brasil é o quarto País do mundo em número de mães solteiras. Os homens brasileiros apoiam a ida das mulheres para o mercado de trabalho, porém somente 6,1% deles dividem as tarefas domésticas com elas. Entre eles, o índice de satisfação no casamento é de 54%, entre elas, esse número está dez pontos abaixo (44%), com a maioria insatisfeita com a vida a dois.
As mulheres trabalham bem mais do que os homens nos afazeres domésticos, o dobro ou até três vezes mais, em número de horas, e mesmo aquelas que trabalham 40 horas semanais fora de casa.
Há, ainda, a exploração sexual contra as mulatas – não só no carnaval – que são violentadas e relegadas a um papel de mulher-objeto a partir de uma visão machista, sexista e discriminatória.
Dados epidemiológicos evidenciam uma diminuição da qualidade e da expectativa de vida da população negra, tanto pelas altas taxas de morte materna e infantil, como pela violência vivenciada de forma mais intensa por esse grupo populacional.
Segundo Lielza Molina, gerente do Núcleo de Vigilância e Agravos Não Transmissíveis, da Secretaria da Saúde de Corumbá, a construção da Politica Nacional de Saúde Integral da População Negra está fundamentada nas evidências das imensas desigualdades em saúde dessa população e expressa o compromisso do governo com a diminuição das desigualdades. “A mulher negra sofre mais do que a mulher branca não só em relação à violência, mas também de hipertensão, pressão alta e diabetes na gravidez, pré-eclapsia, câncer de colo de útero e doenças falciformes, entre outros males”, explicou ela às mulheres presentes no encontro. “É preciso que todas adotem um estilo de vida e uma postura preventiva em relação a tudo isso”, acrescentou.
Avanços
Durante o Encontro também foram evidenciados os avanços, direitos e leis que protegem a mulher, em geral, e a mulher negra no País. O contingente de mulheres negras na Universidade aumentou três vezes mais em relação ao número de mulheres brancas, a Lei Maria da Penha foi sancionada e estabelecida, bem como o Programa Brasil Quilombola; o racismo hoje já é considerado crime (Lei 7.716/89); a Lei 10.639/03, que tornou obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira e aborda a formação do professor que irá trabalhar especificamente com a temática étnico-racial com foco em afro-brasileirismo. Há também a Lei 11.645/08, que obriga os estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, a incluir o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena em sua grade escolar. Foram destacados também os programas na área de saúde e educação da mulher negra.
Confraternização
O 3º Encontro Regional das Mulheres Negras de Corumbá e Ladário não teve somente palestras informativas, mas foi marcado também por muita confraternização e música, com a banda Manoel Florêncio fazendo o encerramento.
A secretária de Assistência Social e Cidadania, Andrea Cabral Ulle, elogiou o evento, o engajamento feminino e o fato de Corumbá ter conseguido três vagas de representantes para a III Conferência Nacional da Promoção da Igualdade Racial (CONAPIR), que será realizada entre 5 a 7 de novembro, em Brasília. “Parabéns ao incansável trabalho da Gerência de Promoção da Igualdade Racial de Corumbá. Trabalharemos sempre juntos pela busca de diversas formas de valorização étnica e cultural na questão da promoção da igualdade racial”, disse.
Além da secretária, prestigiaram o evento também a vice-prefeita de Corumbá, Márcia Rolon, que representou o prefeito Paulo Duarte; a secretária de Educação, Roseane Limoeiro; e o subsecretario de Assistência Social e Cidadania, Nilo Corrêa.