Lavagem da escadaria e louvação à Iemanjá unem religiões

 Prefeitura de Corumbá

  

 Ritual foi acompanhado por centenas de pessoas, na noite desta terça-feira

Um gesto de maturidade religiosa. Foi assim que o padre Celso Ricardo da Silva, pároco da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Candelária, definiu a cerimônia da Lavagem da Escadaria pelos representantes das tendas de Umbanda e Candomblé na noite desta terça-feira, 30 de dezembro. A declaração do religioso católico foi feita durante a Homilia da missa solene, que contou com a presença de membros de religiões com matriz africana. O evento, que conta ainda com a Louvação à Iemanjá às margens do rio Paraguai, é promovido pela Prefeitura de Corumbá e integra o calendário de eventos do município, desenvolvido pela administração do prefeito Ruiter Cunha de Oliveira.

“Demonstra a maturidade religiosa de nossa paróquia; do nosso povo e nossos irmãos. Não nos assustamos e convidamos para que venham sempre. Estamos muito honrados com a presença deles [líderes de religiões com matriz africana], que aqui vêm para purificar a escadaria de nossa igreja”, disse o religioso durante a celebração.

Ainda na cerimônia, padre Celso ressaltou a relevância do ritual e o classificou como uma “grande homenagem” à igreja construída por Frei Mariano no século 19. “É um exemplo claro de união, de convivência pacífica e respeito mútuo que temos um pelo outro. Todos somos filhos de Deus. Este gesto de lavar a nossa escadaria [com água de cheiro] significa purificar a passagem para Deus”, afirmou o religioso destacando que apenas duas igrejas brasileiras recebem o ritual e uma delas é a de Corumbá. A outra fica em Salvador, capital baiana. 

“Essa cerimônia é muito importante e mostra para toda a sociedade que Deus é único e onipotente, seja em qual religião for”, disse o pai de santo Clemilson Medina enfatizando o espírito de união e fraternidade que envolve todo o ritual. Depois da missa e da lavagem da escadaria a população acompanhou a pé, pela ladeira Cunha e Cruz, o cortejo do candomblé até a prainha do Porto-Geral, para a Louvação a Iemanjá, onde o candomblé se junta a umbanda e quimbanda para render homenagens à Rainha das Águas lançando oferendas no rio Paraguai ao som de atabaques e cânticos em Iorubá – idioma africano. A louvação também acontece na noite desta quarta-feira, 31 de dezembro, no mesmo local.

Escadaria

A tradição de lavar as escadarias das igrejas surgiu em Salvador. Na Bahia, a Lavagem do Bonfim é considerada a segunda maior manifestação popular e a principal festa religiosa. Em 1754, quando a imagem do Senhor Crucificado foi transferida da Igreja da Penha, em Itapagipe, para a sua própria igreja, na Colina Sagrada, as escravas queriam assistir à missa e lavar a igreja com ervas de cheiro (como alecrim, alfazema e manjericão e flores), mas foram impedidas.

Depois de terem as portas da igreja fechadas, ao descer as escadas o orixá de um Pai de Santo quebrou o vaso que continha água de cheiro na escadaria, nascendo assim a tradição que é mantida também em Corumbá.

Iemanjá

Conta a história popular que Iemanjá era uma mulher muito bonita. Orungã, o Édipo africano, apaixona-se por sua mãe, que procura fugir de seus ímpetos arrebatados. Mas Orungã não conseguiu renunciar àquela paixão insopitável. Aproveita-se, certo dia, da ausência de Aganju, o pai, e decide-se a violentar Iemanjá. Essa foge e põe-se a correr, perseguida por Orungã.

Na fuga cai no chão, de costas e morre. Imediatamente seu corpo começa a dilatar-se. Dos seios brotaram duas correntes de água que se reúnem mais adiante até formar um grande lago. E do ventre desmesurado, que se rompe, nascem os seguintes deuses: Dadá, deus dos vegetais; Xango, deus do trovão; Ogum, deus do ferro e da guerra; Olokum, deus do mar; Oloxá, deusa dos lagos; Oiá, deusa do rio Niger; Oxum, deusa do rio Oxum; Obá, deusa do rio Obá; Orixá Okô, deusa da agricultura; Oxóssi, deus dos caçadores; Oké, deus dos montes; Ajê Xaluga, deus da riqueza; Xapanã (Shankpannã), deus da varíola; Orum, o Sol; Oxu, a Lua.

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